quarta-feira, 3 de março de 2010

O Cânon e o Texto do Novo Testamento

 Por Robert H. Gundry


Perguntas Normativas:

- Como conseguiu viver a Igreja primitiva, no começo, sem o Novo Testamento?
- Como foi, então, que o Novo Testamento veio a ser considerado pela Igreja como uma autoridade coletânea de livros?
- Como sabemos que o nosso Novo Testamento exibe uma versão substancialmente acurada do que o seus autores originalmente escreveram?


O CÂNON

O Cânon do Novo Testamento consiste dos livros aceitos pela Igreja primitiva como Escrituras divinamente inspiradas. O termo cânon a princípio significava vara de medir, mas terminou adquirindo o sentido metafórico de padrão. No que tange ao Novo Testamento, refere-se àqueles livros aceitos pela Igreja como o padrão autoritativo de crença e conduta.

No princípio, os cristãos não contavam com qualquer dos  livros que figuram em nosso Novo Testamento. Assim sendo, eles dependiam do Antigo Testamento, de uma tradição oral acerca dos ensinamentos e da obra remidora de Jesus, e de revelações diretas da parte de Deus, por meio dos profetas cristãos. Mesmo depois de já terem sido escritos os livros do Novo Testamento, muitos desses livros não haviam ainda sido geograficamente distribuídos por toda a Igreja. E antes de serem colecionados para formação do Novo Testamento, escritores cristãos haviam produzido alguns outros livros – alguns bons, e  outros de inferior qualidade. Livros como as epístolas de Paulo e os evangelhos receberam reconhecimento canônico de imediato. Mas uma autoridade incerta levou outros livros, como Hebreus, a serem postos em dúvida por algum tempo. 

A Igreja primitiva hesitou em adotar a segunda epístola de Pedro, porquanto no grego o seu estilo difere da primeira epístola de Pedro, e isso fez surgirem dúvidas sérias quanto à sua reivindicação de ter sido escrita pelo apóstolo Pedro. Por causa de sua brevidade e circulação limitada, alguns desses livros simplesmente não se tornaram conhecidos em círculos suficientemente amplos para serem aceitos de proato no cânon.

Citações extraídas dos livros do Novo Testamento, e isso de maneira autoritativa, pelos primeiros pais da Igreja, ajudam-nos a reconhecer quais livros eles reputavam canônicos. Mais tarde, a Igreja compilou listas formais de livros, ou cânone. Um dos primeiros foi o cânon de Márciom (cerca de 144 D.C.). Um herege gnóstico, Márciom ensinava a existência de um severo Deus do Antigo Testamento e de um amoroso Deus do Novo Testamento, que se oporiam mutuamente, e também que Jesus Cristo viera como mensageiro do amoroso Deus do Novo Testamento, que fora morto por instigação do deus do Antigo Testamento, que Jesus confiara o evangelho aos doze apóstolos, mas estes não tinham evitado a corrupção do mesmo e que Paulo se tornara o único pregador do verdadeiro evangelho. Assim, pois, Márciom selecionava apenas aqueles livros que ele considerava livres do Antigo testamento e do Judaísmo, e contrários aos mesmos – Lucas (com algumas omissões) e a maior parte das epístolas de Paulo. A violenta reação de cristãos ortodoxos contra a breve lista preparada por Márciom demonstra o fato que, como um todo, a Igreja já havia aceito os livros do Novo Testamento que Márciom rejeitava. Noutros particulares, o cânon de Márciom não teria causado tanta perturbação. No século IV D.C. todos os nossos livros do Novo Testamento já haviam sido reconhecidos de modo geral, ao passo que outros livros tinham sido rejeitados. Os concílios eclesiásticos dos séculos IV e V D.C. meramente formalizaram a crença e a prática então existente, no que concerne ao cânon do Novo Testamento.

            Somos levados a crer que Deus guiou providencialmente a Igreja primitiva em sua avaliação de vários livros, pelo que aqueles que realmente forma inspirados tornaram-se aceitos, ao passo que aqueles que não eram inspirados, embora ocasionalmente aceitos como dotados de nível não- autoritativo, foram rejeitados do cânon. O processo de seleção precisou de algum tempo, e levantaram-se diferenças de opinião. Porém, podemos estar gratos porque a Igreja primitiva não aceitou certos livros sem a devida avaliação, e , algumas vezes,sem debate. A maioria dos leitores que faz a comparação dos escritos sub-apostólicos e dos livros apócrifos do Novo Testamento com os livros canônicos do Novo Testamento, de todo coração endossa o julgamento crítico dos cristãos primitivos.

            Diversos critérios de canonicidade têm sido sugeridos, como a consonância com a doutrina oral apostólica do primeiro século de nossa era, ou como o efeito moral edificante. Não obstante, alguns livros capazes de edificar a seus leitores não conseguiram atingir estado canônico na Igreja. Outro tanto se pode dizer quanto a alguns livros que levavam avante a tradição da doutrina apostólica. O critério mais importante – de fato, crucial – era o da apostolicidade, isto é, autoria da parte de um apostolo, e, por conseguinte, também haver sido escrito numa data dentro do período apostólico.

            Marcos foi companheiro tanto do apóstolo Pedro quanto do apóstolo Paulo. Lucas foi companheiro de Paulo. E quem quer que tenha sido o autor da epístola  aos Hebreus, exibe contatos teológicos bem próximos de Paulo. Tiago e Judas eram meio-irmãos de Jesus, associados dos apóstolos na primitiva igreja de Jerusalém. Tradicionalmente, todos os demais autores cujas obras fazem parte do Novo Testamento eram apóstolos -  Mateus, João, Paulo e Pedro. A crítica moderna lança dúvidas sobre a exatidão da atribuição tradicional a certos autores. Essas questões são tratadas individualmente em seções posteriores deste livro. Porém, mesmo segundo ponto de vista críticos negativos, usualmente não é negado que livros não apostólicos tivessem sido escritos, dentro da tradição apostólica, por seguidores dos apóstolos.O próprio Jesus asseverou a total autoridade do Antigo Testamento como Escritura.³ Outrossim, conferiu às Suas próprias palavras e ações um privilégio igualmente autoritativo, e prometeu aos apóstolos que o Espírito Santo haveria de relembrar-lhes a significação do mesmo (João 14:26; 16: 12-15). O cânon do Novo Testamento, pois, é o registro e a interpretação autoritativa da revelação que Deus fez de Si mesmo por meio de Jesus Cristo – um registro interpretativo autenticado pelo nosso Senhor em pessoa, cuja perspectiva acerca de Suas próprias palavras e ações, agora escritas e explanadas pelos apóstolos e seus associados, certamente não era menos que Sua perspectiva acerca do Antigo testamento como a Palavra de Deus.

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